QUANTAS PESSOAS VOCÊ INCOMODA?

Imagem Movimento Fofoca 2

“Incomoda muita gente
Se você vai fundo no que faz.
Incomoda o seu caminho diferente,
Incomoda um ser humano singular…
Alguém que simbolizará,
Mesmo sem querer,
Uma insuportável
Vontade de viver.”

In: Graffitti – de Guilherme Arantes

Quem aí nunca foi vítima de uma fofoca? Quem nunca a cometeu? Que levante a mão e não atire nada.

Importante entender, de uma vez por todas, que a fofoca é, basicamente, um discurso moral que existe a fim de que a/o fofoqueira/o se afirme como dona/o de uma ‘verdade’ na qual ela/ele sequer acredita.

E quem nunca percebeu que fofocas podem prejudicar muitas pessoas inocentes e que têm o poder de causar tragédias?

De uma coisa temos certeza: apenas seus autores se divertem. Se eles são ingênuos? Longe de mim acreditar nisto. Eles sabem exatamente o poder da dor que provocam assim como parecem programados para destruir. É uma espécie de jogo mórbido, ao qual se entregam com deleite.

Além disto, no silêncio de seus crimes, os efeitos sobre suas vítimas estão longe de ser triviais. Depressões, conflitos, isolamento, são algumas das consequências provocadas nos alvos escolhidos. Se os fofoqueiros contumazes, desprovidos de dignidade, conseguem se livrar de suas culpas, é graças ao inconsciente que os ordena.

Porém, é preciso reconhecer que a fofoca, como um incêndio, se extinguiria alguns segundos antes de se espalhar, e os rumores não teriam nenhum impacto, se ninguém lhes desse crédito, não é mesmo?

Ainda que os antropólogos acreditem que, ao longo da história humana, a fofoca teria sido uma maneira utilizada para que os homens se relacionassem uns com os outros e, às vezes, como uma ferramenta para isolar aqueles que não estão apoiando o grupo, sabemos que muitos possuem um forte impulso para saber sobre a vida de pessoas com as quais nem sequer se relacionam intimamente.

É uma espécie de fascínio – muitas vezes temperado com algumas toneladas da mais pura inveja.

Porque assim agem os (as) fofoqueiros (as) diuturnamente. Apontando suas lanças longas e afiadas em direção às jugulares das vítimas que ousaram fazer/falar/praticar/ouvir/perceber/amar e viver diferente.

Pense bem: existe coisa mais assustadora do que a corajosa e surpreendente originalidade humana se contrapondo àqueles que escolheram covardemente repetir papéis que os transformam em simples e grotescas cópias surradas do restante da humanidade que, convenhamos, vai muito mal, obrigada?

O fofoqueiro, é claro, é sempre aquele que se sente infeliz com as próprias escolhas e, consequentemente, com a própria existência. Percebe-se tão desprovido de felicidade que, amargurado, procura parecer um ser-humano confiável: doce e bonzinho por fora, mas todo recalcado e destrutivo por dentro. Pratica sua crueldade de maneira sutil e dissimulada e observa muito, com assombrosa paciência, até assimilar maneiras de como atingir seus antagonistas.

Afinal, a especialidade do fofoqueiro é mirar na vida dos outros no lugar de olhar para a própria história. Aliena-se de si próprio concentrando-se histericamente naquilo que está do lado de fora.

O fato é que muitas pessoas buscam informações da vida dos outros com o único e mórbido objetivo de descobrir o que imaginam ser as fraquezas e medos destes para, assim, poderem roubar-lhes uma réstia da sua luz.

E é nesse terreno árido e infecundo da insatisfação com a própria biografia, que a fofoca germina, brota, cresce, e ganha autonomia para lutar justamente contra todo o ‘novo’ que for capaz de germinar, brotar, crescer até ganhar autonomia para se expandir.

Desta forma, a aluna charmosa e bonita passa a ser a vagabunda da turma; o menino inteligente e sensível, o nerd afeminado; a divorciada alegre, a desesperada; o homem simpático, o tarado; a viúva sorridente, a desvairada; o cara que abandona um emprego seguro, o insano amargurado; a mulher que frequenta um lugar sozinha, a desavergonhada; o homem justo e cortês, o tolo inflamado; o que não se submete ao suborno, o burro; o que não suborna, o estúpido; o que age conforme sua própria consciência, o idiota.

A fofoca é, invariavelmente, uma agressão coletiva, mesmo que disfarçada enquanto ato pessoal.

Quando pessoas comentam maliciosamente sobre a vida de alguém, na verdade, estão desqualificando um grupo inteiro, um gênero ou uma classe. Agem como bons samaritanos pela frente e, por detrás, mostram sua pérfida faceta – aquela que ninguém vê posto que se encontra oculta nas meras e aceitáveis aparências.

Esta é a derivação mais terrível da agressão: fazer de conta que é bonzinho e sorrateiramente machucar por debaixo dos panos imundos.

Muito mal compreendidas, as pessoas que resolvem levar a sério a fofoca são consideradas medrosas ou superficiais. Exige-se que deixem os fofoqueiros “em paz” sob a máxima do “o que vem de baixo não atinge!” Como assim, cara pálida? Não atinge quem?

“ – Você leva à sério uma fofoca? Que bobagem! Apenas não tome conhecimento…”

O que poucos sabem é que a fofoca, prima-irmã da calúnia e sobrinha da difamação, é nada mais nada menos do que e explicitação clara do medo de ver alguém ter coragem de fazer aquilo que todos desejam fazer. Ou seja: todos espreitam, cuidam e controlam os outros para garantir que ninguém – absolutamente ninguém – faça o que, no fundo, todo mundo desejaria fazer.

Todos sentem medo de todos. E a maioria, para não ser infernizada, finge desconhecer a potencialidade e a grandeza natural com as quais somos brindados ao nascer. E, no lugar de admirar e se espelhar, invejam tudo o que cresce com força e liberdade.

Invejamos a coragem e a determinação alheias quando não as praticamos pelo temor de sermos criticados e julgados. E, assim, deixamos de ser criativamente livres!

E disto resulta o temor do olhar do outro, que observa atentamente tudo o que fazemos, sempre pronto para criticar, condenar e impôr restrições – porque temos coragem de fazer diferente dele.

“Se não gosto de você, se suas atitudes me incomodam, eu simplesmente espalho uma infâmia acerca de qualquer comportamento seu. E se eu tiver informações privilegiadas a seu respeito – e os amigos e as amigas são sempre os piores difamadores justamente por isto – então, adiciono um dado bastante realístico ao comentário impiedoso e, deste jeito, o cubro com uma aparente credibilidade que será capaz de transformar minha maldade numa verdade com o poder de ser reproduzida dali para a frente.”

Fácil, fácil nos tornamos vítimas desses perversos algozes. Mais fácil ainda é nos transformarmos nestes mesmos carrascos.

Portanto, tome sempre muito cuidado. Torne-se um eterno e incansável vigilante. Não permita que esta insanidade se instale na sua vida e nas dos que lhe são próximos. Afaste-se do fofoqueiro e da fofoca lembrando-se de que estamos sempre arriscados a reconhecer o encanto do outro, a mazela do outro, o sucesso do outro, o fracasso do outro no lugar de considerar nossas próprias questões – e quando as percebemos como se pertencessem a uma outra vida que não a nossa.

Enxergamos com muita clareza o que imaginamos ser o lixo do outro, mas a sujeira de nossos próprios porões fica no lugar mais obscuro da nossa consciência.

Não se esqueça de que seu olhar precisa aprender a atravessar sua própria existência para, desta forma, alcançar com humildade (e sabedoria) a sua mais profunda verdade.

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