A MENTIRA MORA AO LADO

Imagem Movimento Mentira 2

Querem me ensinar,
querem me julgar pelo que eu fiz.
Querem me julgar,

querem me ensinar como se diz
Mentiras!

In: Mentiras – Titãs

Meu pai teve um grande e admirável amigo, daqueles que a gente era capaz de ficar horas ouvindo uma vez que, além de ser um ser incrivelmente culto, sabia lidar com as palavras utilizando ora seu riquíssimo vocabulário, ora sua ironia sutil, sem jamais cansar seus interlocutores – mesmo depois de horas e horas de histórias ouvidas.

E é dele a mensagem que, depois de ouvida, nunca mais descolou dos meus pensamentos:

Se você sempre caminhar por estradas retas, jamais terá problema para lembrar das esquinas pelas quais passou. Você sempre saberá onde reencontrar o caminho ou os cruzamentos que atravessou. Não haverá dúvida. Muito menos medo. É como viver a verdade. Nunca haverá confusão se você simplesmente disser a verdade

Palavras sábias que sempre me orientaram vida afora, mas que dificilmente percebo seguidas por pessoas definidas tanto por sua economia com a verdade quanto pela falta de empatia.

Hoje em dia a mentira pode ser considerada uma falha moral, posto carregar uma conotação negativa, ainda que sua utilização possa ser concebida, do ponto de vista biológico, como um dos nossos mecanismos de sobrevivência. 

Dito isto, vamos pensar um pouco sobre a prevalência desta terrível prática na maioria dos ambientes sociais, familiares e íntimos.

Podemos começar propondo que a honestidade seja um dos principais componentes da integridade (você sabe, fazer a coisa certa quando ninguém está olhando, por exemplo).

No entanto, e não há como negar, sabemos também que mentir é quase o mesmo que escovar os dentes. A maioria das pessoas mente para outras pelo menos uma ou duas vezes por dia, e durante uma semana elas mentem para 30% dos indivíduos com as quais interagem. Sim! Existem pesquisas apontando isto. Agora, vai lá saber se os pesquisadores não são eles também mentirosos, né?

Como qualquer mau hábito, se você for pensar em impedi-lo, antes você terá que entender o que está motivando tal comportamento.

As primeiras mentiras que contamos quando crianças, ainda estão misturadas com uma boa dose de fantasias, sonhos, desejos, etc.

E assim como as crianças gostam de explorar novos espaços, elas exploram este inédito playground mental também. Assim, vão mentir sobre seus brinquedos, sobre a importância dos seus pais na sociedade, sobre o que conhecem, os animais que a mãe deixa ter, sobre a coragem do pai e mais uma sorte de coisas – apenas para ver o que vai acontecer. É uma espécie de teste de realidade.

As primeiras mentiras que as crianças contam tendem a ser indiscriminadas e, à medida que descobrem as consequências, este comportamento vai se transformando até que ela entre em paz com as próprias verdades.

O que pode tornar tudo mais complicado, evidentemente, é a orientação moral dos pais. Quantas vezes você viu, viveu ou até praticou a farsa do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”?

Adultos que ensinam aos filhos que ‘mentir é feio’, enquanto, descaradamente, escondem as verdades incômodas, você já viu, né? Mamãe pode mandar o Júnior para dizer à avó que ele adorou o casaco que ela lhe deu, mesmo que tenha detestado.

O fato é que em algum momento, para muitos adultos, mentir se torna uma estratégia ocasional. Ou não. Pode se tornar um modo de vida. E é aí que mora o perigo.

Ainda que muitos acreditem (e defendam) que mentir possa ter uma função protetora, a verdade é que se mente por vergonha ou quando se tenta evitar ser exposto àquilo que se fez de errado.

No fundo, o que tentam proteger é uma imagem – uma falsa imagem, por sinal – encobrindo as falhas pelas quais acham que os outros passarão a lhes menosprezar.

Outras vezes as razões são mais complicadas. Podem envolver medo de punição ou de um eventual constrangimento. Podem servir para esconder uma situação embaraçosa ou para que os demais acreditem a pessoa melhor do que ela sabe que é.

Este tipo de engodo não é admirável, mas não é difícil entender por que ele ocorre, não é mesmo? A pessoa que engana, de um jeito ou de outro, se convenceu de que a verdade não vai ajudá-la e vai fazê-la correr o risco de ser rejeitada ou ficar isolada.

Os mentirosos patológicos falsificam a realidade como rota de fuga, para obter atenção e até admiração, e entram em um círculo vicioso que acaba por deixá-los sozinhos no labirinto de suas mentiras. Normalmente dissimulam compulsivamente sem que, no entanto, tenham motivos para fazê-lo. Suas mentiras costumam ser elaboradas e detalhadas e, de algum jeito, difíceis de verificar. Tratava-se de um comportamento compulsivo e obsessivo cuja razão escapa, inclusive, ao próprio mentiroso.

Uma vez que mentira patológica ainda não é uma condição reconhecida, não há tratamentos formais. No entanto, ela pode ser sintoma de vários transtornos de personalidade, incluindo distúrbios de personalidade antissociais, narcisistas e histriônicos. Outras condições, como o transtorno de personalidade limítrofe, também podem levar a mentiras frequentes.

Mas a mentira mais escabrosa, convenhamos, é aquela consciente e que envolve uma associação com outros enganadores.

O poder, por exemplo, é capaz de tornar as pessoas mais propensas a mentir, a trapacear, a antagonizar no trabalho, dizem os especialistas. E a pessoa demente por poder consegue, desgraçadamente, alterar o estado das pessoas que a rodeiam, com seus pensamentos, seus sentimentos, suas ações e suas fraudes.

E como esta criatura alcança o poder? O que tanto teme sobre ele? Oras, ela entende que não pode desistir justamente porque é seu maior vício e seu único objetivo de vida.

As pessoas dão poder a outros se eles parecem ousados em suas ideias, se parecem compartilhar o que sabem e o que podem dividir, sem se preocuparem em acumular para si próprios. Porém, o poder pode corromper pessoas de caráter duvidoso. E disto ninguém parece ter dúvidas.

Afinal, lembre-se: a verdade não importa para narcisistas.

Quando um não se importa com os outros, mentiras parecem indispensáveis. A falta de empatia significa essencialmente a falta de consciência, que é um conceito de difícil compreensão para certas pessoas.

O fato de mentirem não as preocupa da mesma forma como ocorreria com pessoas bacanas, como eu e você, concorda?

Mentem para controlar a própria narrativa e difamam aqueles que não se submetem aos seus caprichos, espalhando que eles não devem ser considerados ‘confiáveis’. Ou seja, projetando exatamente o que eles são.

O perigo é que os impostores são extremamente perversos para as pessoas mais sensíveis, aquelas que atraem os narcisistas e depois não conseguem mais se desvencilhar deles.

Portanto, se alguém mente, não tente inventar uma desculpa sobre isso. Uma mentira é uma mentira. E se você tentar justificá-la ou imaginar que a responsabilidade pode ser de outros, tenha certeza de que há algo de muito errado acontecendo.

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