SOBRE RESSENTIMENTOS

Imagem Movimento Ressentimento

“Quem cala sobre teu corpo
Consente na tua morte,
Talhada a ferro e fogo
Nas profundezas do corte

Que a bala riscou no peito.
Quem cala morre contigo
Mais morto que estás agora,
Relógio no chão da praça.”

In: Menino – de Milton Nascimento

Luísa participa de um grupo cuja ‘líder’, tempos atrás, resolveu atacar pessoas das quais não gostava, usando a odiosa tática da velha e detestável fofoca. Aparentemente, começou sua estratégia se aliando a outras/os detratoras/es, numa espécie de ‘força-tarefa’ que foi se espalhando como um vírus mortal, infectando organismos fracos e indefesos. Aliás, é assim que maledicências e difamações se reproduzem. Sem exceção.

E, desta forma bastante torta, foi reunindo os mais incautos ao seu redor, formando uma complexa teia de desinformação e maledicência que eu, honestamente, nunca havia imaginado existir.

Quando, a certa altura, um jovem assustado com a dimensão que os ruídos tomavam, resolveu denunciá-la para outras pessoas, o que ocorreu foi que ele, também, tornou-se um alvo, do mesmo jeito que todos aqueles que resolveram defendê-lo.

Sobre a prática corrosiva da difamação como meio para chegar a um determinado fim, ainda que não seja o foco deste post, já escrevi bastante. Principalmente por ter presenciado famílias sendo aniquiladas, relacionamentos destruídos e comunidades praticamente extintas por conta de um punhado de palavras que, proferidas por alguém, nada tinham de verdadeiras.

Me arrisco afirmar que a fofoca é uma das maiores perversidades que se pode cometer contra pessoas verdadeiramente humanas. E que, diante dela, se faz necessária uma resposta rápida e firme. Para que não se espalhe feito unhas de gato.

Por estas e outras é que tenho lamentado muito os tempos difíceis que temos vivido enquanto humanidade.

Andamos todos meio que aos trancos e barrancos, entre paus e pedras, e é preciso muito tato, além dos cuidados que antes não nos mobilizavam, para evitarmos sentir ou incitar ódios e mal-entendidos.

E não está nada fácil, minha gente.

Afinal, a porteira do desentendimento foi oficialmente aberta há tempos. E quem é que vai dar conta de fechá-la?

O post de hoje fala do enraivecimento e de seus desdobramentos. Desses que nos alcançam sem que a gente, muitas vezes, nem saiba de onde surgiu o petardo.

Aliás, ultimamente, tenho tido muitos contatos com esta (péssima) modalidade de humor. E isto não é nada saudável de se experimentar, acredite.

Não é sequer necessário experimentar um sofrimento extraordinário ou, ainda, ser injustiçado de forma excepcionalmente dolorosa para sentir o impulso forte e aparentemente irreprimível em direção ao ódio puro e simples. Ainda que nenhum ódio possa ser considerado puro ou simples.

Umas vezes, basta apenas uma desatenção involuntária. Outras, uma série de eventos que culminem com desavenças que jamais serão solucionados. Basta isto e mais nada.

Em pouco tempo, uma pessoa pode escolher uma boa e sólida razão para se ressentir com alguém. E a ‘vítima’ pode ser muito próxima. Um membro da família, o cônjuge, o pai ou a mãe, um amigo de longa data. Um colega de trabalho ou de jornada – estes são os mais visados. É possível que seja o personagem com quem parecia ser impossível desenvolver um conflito.

E o que teria causado tamanha amargura? Como estes corações se tornaram tão inutilmente amortecidos?

O ressentimento alimenta a resistência. E a resistência é uma das principais inimigas das relações de afeto. E, o mais importante, é um dos principais motivos para que os relacionamentos sejam arruinados.

Trata-se de uma condição que geralmente se desenvolve ao longo do tempo. É imperceptível a princípio, mas com o passar dos dias desenvolve camadas e mais camadas que se avolumam sobre cada sentimento de decepção – percebido exclusivamente pelo neurótico. Ou psicótico, quem sabe.

Indivíduos que desde que se conhecem como gente se viram como doadores e raramente receptores nos relacionamentos, serão os mais susceptíveis a formar mágoas sedimentadas ao longo do tempo. 

Por que? Provavelmente porque suas necessidades básicas dentro dos relacionamentos mais primitivos foram ignoradas. 

Relacionamentos saudáveis ​​são baseados em reciprocidade, em dar e receber. Se você está dando, mas não está tomando nada para si, você está em um relacionamento unilateral. Isso precisa ser resolvido ou a decepção vai arruinar você.

Agora, pense no quanto as raivas podem envenenar nossas existências.

E que raio de veneno é este?

Sim. O ressentimento é como o rancor. E os dois se fundem ao redor de uma raiva muitas vezes negada. Outras vezes, mal disfarçada. Embora nem sempre se encontre registrada em nossa consciência, ela está bem ali, vívida, enquanto sensação farta em animosidade e exasperação. Pronta para ser. Preparada para resplandecer com todo o seu furor destrutivo.

O evento que a criou pode ser recente ou passado. E decididamente não foi resolvido no âmbito da consciência. E permaneceu como uma nódoa que nunca mais se desfez. Desta maneira, todas as vezes que vestirmos a blusa manchada veremos que ali se encontra a persistente mancha cuja natureza já nos escapa.

Com o ressentimento funcionamos exatamente igual. Torna-se uma marca “viva” que nos impede de aceitar aquilo que, apenas para nós, parece inaceitável. Destruir este sentimento seria o mesmo de conceber que o responsável por ele saia ileso. Por isso a busca quase incessante pela vingança.

Ele se traduz, em muitos casos, em uma ação consciente. Trata-se de uma opção fácil para aquele que escolhe não entender que sua ira pode e deve ser tratada outra forma muito mais produtiva e sensata. É quase sempre uma experiência emocional que, de algum jeito, desejamos manter intacta. Trancafiada dentro de um baú repleto de mágoas.

Porém, esta emoção continua a nos envenenar e aos nossos “desafetos”. Mesmo que não seja o centro de nossa vida, ocupa um lugar muito importante e é o que nos faz cultivar uma doentia ligação com algo de um passado que poderia (e deveria) ser superado.

Em suma, é possível dizer que o ressentimento serve única e exclusivamente para manter a força de nossa raiva e, acima de tudo, nossa conexão com a experiência que a causou. Mas esta “fidelidade” nos mantém em uma posição vulnerável e potencialmente muito dolorosa. E o mais importante: causa doenças como depressão e câncer – dentre muitas outras mais.

É fundamental saber que apenas o genuíno e sincero contato, temperado com uma colherada extra de boa vontade e indulgência, será capaz de restaurar nossa paz e nos deixar prosseguir a vida com mais alegria e serenidade.

Mais benevolência e amor. Por favor.

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